quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

SOMBRA, O QUE É ISTO?


"Todo homem tem uma sombra e, quanto menos ela se incorporar à sua vida consciente, mais 
escura e densa ela será. De todo modo, ela forma uma trava inconsciente que frustra nossas 
melhores intenções". [C.G. Jung].

Nesta postagem falaremos sobre a SOMBRA, um conceito muito importante da psicologia junguiana que trata do lado obscuro da nossa personalidade....boa leitura.....



Tudo o que tem substância lança uma sombra. O ego está para a sombra como a luz está
para as trevas. Essa é a qualidade que nos torna humanos. Por mais que o queiramos negar,
somos imperfeitos. E talvez seja naquilo que não aceitamos em nós mesmos — a nossa
agressividade e vergonha, a nossa culpa e a nossa dor — que descobrimos a nossa humanidade.

A sombra é conhecida por muitos nomes: o eu  reprimido, o self inferior, o gêmeo (ou 
irmão) escuro das escrituras e mitos, o duplo, o eu rejeitado, o  alter ego,  o  id.

Quando nos vemos face a face com o nosso lado mais escuro, usamos metáforas para descrever esse
encontro com a sombra: confronto com os nossos demônios, luta contra o diabo, descida aos
infernos, noite escura da alma, crise da meia-idade. Todos nós possuímos uma sombra. Ou é a  nossa sombra que nos possui?

Carl Jung transformou essa questão em um enigma quando perguntou: "Como encontras o leão que te
devorou?" Pois a sombra é, por definição, inconsciente; nem sempre é possível saber se
estamos ou não sob o domínio de alguma porção compulsiva dos conteúdos da nossa sombra.
Jung disse que todos nós compreendemos intuitivamente o significado das expressões
sombra, personalidade inferior  ou  alter ego.  "E se ele acaso esqueceu", brincou Jung,
referindo-se ao homem médio, "sua memória pode ser facilmente refrescada por um sermão de
domingo, por sua esposa ou pelo coletor de impostos."

Para podermos ser capazes de encontrar a sombra na nossa vida cotidiana — dando-lhe
acesso e, assim, rompendo seu domínio compulsivo sobre nós — precisamos, antes de mais
nada, alcançar uma compreensão abrangente do fenômeno. O conceito de sombra deriva das
descobertas feitas por Sigmund Freud e Carl Jung. Guardando o devido respeito ao seu antigo
mestre, Jung reconheceu que o trabalho revolucionário de Freud foi a análise mais detalhada e
profunda da cisão que existe entre o lado da  luz e o lado da sombra na psique humana. De
acordo com Liliane Frey-Rohn, antiga aluna e colega de Jung, "Já em 1912, enquanto ainda sob
a influência das teorias de Freud, Jung usava a expressão 'o lado da sombra na psique humana’
para caracterizar 'desejos não reconhecidos' e 'porções reprimidas da personalidade' ".

Em 1917, em seu ensaio On the Psychology of the Unconscious [Sobre a Psicologia do
Inconsciente], Jung fala da sombra pessoal como o outro em nós, a personalidade inconsciente
do nosso mesmo sexo, o inferior repreensível, o outro que nos embaraça ou envergonha: "Por
sombra, quero dizer o lado 'negativo' da personalidade, a soma de todas aquelas qualidades
desagradáveis que preferimos ocultar, junto com as funções insuficientemente desenvolvidas e o conteúdo do inconsciente pessoal."

A sombra é negativa apenas a partir do ponto de vista da consciência; ela não é — como
insistia Freud — totalmente imoral e incompatível com a nossa personalidade consciente. Pelo
contrário, ela contém em potencial valores da mais elevada moralidade. Isso é particularmente
verdadeiro, diz Frey-Rohn, quando existe um lado oculto na sombra que a sociedade considera
como positivo, ainda que a própria pessoa o veja como inferior.

A sombra aproxima-se mais daquilo que Freud entendia como "o conteúdo reprimido". Mas, em contraste com a visão de Freud, a sombra de Jung é uma personalidade inferior que tem seus próprios conteúdos, tais como pensamento autônomo, idéias, imagens e julgamentos de valor, que são semelhantes aos da personalidade consciente superior. Em 1945, Jung referia-se à sombra como simplesmente aquela coisa que uma pessoa não queria ser. "Uma pessoa não se torna iluminada ao imaginar formas luminosas", afirmou, "mas sim ao tornar consciente a escuridão. Esse último procedimento, no entanto, é desagradável e,
portanto, impopular."

Hoje em dia, entendemos por sombra aquela  parte da psique inconsciente que está mais
próxima da consciência, mesmo que não seja completamente aceita por ela. Por ser contrária à
atitude consciente que escolhemos, não permitimos que a sombra encontre expressão na nossa
vida; assim ela se organiza em uma personalidade relativamente autônoma no inconsciente,
onde fica protegida e oculta. Esse processo compensa a identificação unilateral que fazemos
com aquilo que é aceitável à nossa mente consciente.

Para Jung e seus seguidores, a psicoterapia  oferece um ritual de renovação pelo qual a
personalidade da sombra pode ser percebida e assimilada, reduzindo assim seus potenciais
inibidores ou destrutivos c liberando a energia vital positiva que estava aprisionada. Jung
continuou a ocupar-se com os problemas correlatos de destrutividade pessoal e mal coletivo
durante toda a sua longa e ilustre carreira.
Suas investigações mostraram que lidar com a sombra e o mal é, em última análise, um "segredo individual", igual àquele de experimentar Deus, e uma experiência tão poderosa que pode transformar a pessoa como um todo. [Grifos Meus]

Jung buscava respostas para as inquietantes questões que nos perturbam a todos, diz o
estudioso junguiano Andrew Samuels, e o trabalho de sua vida oferece "uma explicação
convincente, não apenas das antipatias pessoais mas também  dos cruéis preconceitos e
perseguições dos nossos tempos". Jung via o seu próprio destino como o de um explorador, um
homem a criar novos caminhos para conceituar antiqüíssimos problemas — problemas
psicológicos bem como problemas filosóficos,  espirituais e religiosos. Ele disse que queria
dirigir-se àquelas pessoas que buscam um significado em suas vidas, mas para quem os
tradicionais veículos da fé e da religião não funcionam mais.

Na publicação de 1937, Psychology and Religion [Psicologia e Religião], Jung diz; "Provavelmente tudo o que nos resta hoje é a abordagem psicológica. É por isso que tomo essas formas-pensamento que se tomaram historicamente cristalizadas, tento derretê-las e vertê-las dentro dos moldes da experiência
imediata."
Robert A. Johnson, conhecido autor c conferencista cujos escritos incluem-se na terceira
geração de idéias junguianas, diz que a contribuição duradoura de Jung foi o desenvolvimento
de uma visão magnífica da capacidade humana para a consciência.


"Ele postulou um modelo do inconsciente  tão monumental que o Ocidente ainda não foi
plenamente capaz de apreender todas as suas implicações.Talvez a maior realização de Jung tenha sido  a de revelar o inconsciente como a fonte criativa de tudo aquilo que finalmente chegamos a ser enquanto indivíduos. Na verdade, nossa mente e personalidade conscientes se desenvolvem e amadurecem a partir da matéria-prima do inconsciente, em interação com as experiências da vida.
Juntamente com o self (o  "eu", o "si-mesmo", o centro psicológico do ser humano) e a
anima e o animus (as imagens ideais internalizadas do sexo oposto, a imagem da alma em cada
pessoa), Jung classificou a sombra como um dos principais arquétipos do inconsciente pessoal.

Os arquétipos são estruturas inatas e herdadas no inconsciente — "impressões digitais"
psicológicas — que contêm características formadas de antemão, qualidades pessoais e traços
compartilhados com todos os outros seres humanos. Eles são forças psíquicas vivas dentro da
psique humana. De acordo com o  Critical Dicionary of Jungian Analysis,  "Os deuses são
metáforas de comportamentos arquetípicos e os mitos são representações arquetípicas'". O
decurso da análise junguiana envolve uma percepção crescente dessa dimensão arquetípica da
vida de uma pessoa.


Certa vez, exasperado com alguns discípulos que faziam citações literais de seus conceitos
fora do contexto, Jung disse: "A sombra é simplesmente todo o inconsciente!" Embora não
falasse a sério, sua observação só seria  verdadeira se uma pessoa não tivesse a mínima
percepção do inconsciente na vida cotidiana. Pois, tão logo começamos a desenvolver a
percepção de porções da personalidade inconsciente, a sombra assume uma forma pessoal
identificável, e isso inicia o processo de trabalho com a sombra. Esse procedimento acabará por
levar-nos a uma profunda percepção de quem realmente somos. De acordo com o analista Erich
Neumann: "O self fica escondido na sombra; ela é a guardiã dos portais, a guardiã da entrada. O
caminho para o self é através dela; por trás do aspecto escuro que ela representa está o aspecto
da totalidade, e é só fazendo amizade com a sombra que ganhamos a amizade do self."

NOTA:

ZWEIG, Connie; ABRAMS, Jeremiah - AO ENCONTRO DA SOMBRA - O Potencial Oculto do Lado Escuro da Natureza Humana - Editora Cultrix - São Paulo







2 comentários:

  1. E, aí Marcelo?
    Estava pensando na definição de Jung a qual você postou e fiquei pensando. Se de um lado a sombra é o nosso inconsciente, então as frustrações bem como tudo aquilo que poderíamos ter feito e não fizemos pode muito bem ser chamado de fantasma. Esse é um assunto muito interessante que está de certa forma ligado a questão do não livre arbítrio do homem. O fantasma que nos acomete é tudo aquilo que poderíamos ter feito e não fizemos. Cabe uma pergunta: porquê não fizemos? Uso o termo fantasma pelo fato de em muitas das vezes sermos "assombrados" por coisas que não existem, e infelizmente muitas pessoas ficam presas ao passado pensando em um fantasma que nunca existiu, só em potencial para nós. Em suma, sobra e fantasma fazem parte da vida humana.
    Um abraço.

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  2. Desculpe Evandro, só hoje percebí que o seu comentário havia sido incluido como Spam. mas corrigi o problema. Segue abaixo minha resposta.

    Evandro,

    É possivel sim que estes "fantasmas" sejam criações da nossa própria mente e não algo sobrenatural e que creio também está ligado a questão do não livre arbítrio do homem. Aliás, é um assunto que buscarei compreender dentro da psicologia analítica de Jung. Por isso o conselho de Jung é para "integrar" a sombra (fantasma) à nossa consciencia, ou seja, torná-lo conhecido, saber que ele existe e que ele está aí, definí-lo.

    No mito grego, Jung diz que ao matar o minotauro, Teseu estava na verdade encontrando com a sua sombra. Então, simbolicamente há a morte da sombra, quando você a encontra e a integra à sua vida...E quem não tem esse lado sombrio, não é verdade?

    Abração e obrigado pelo comentário.

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